A última atividade do Berlinale Talents acabou de ser finalizada. Foram 6 dias de intensas atividades circulando entre os três prédios do HAU, um complexo de dança e teatro onde as atividades acontecem todos os dias. Nos últimos três dias, além dos talks convencionais, fui convidado por um dos tutores do Talents Press – um braço do Talents voltado para jornalistas e críticos de cinema – para compartilhar minha experiência na montagem do filme “Retratos Fantasmas”, dirigido por Kleber Mendonça Filho.
Foi incrível poder falar sobre o processo de criação desse filme com um público que não conhece muito das técnicas da montagem, mas que são especialistas em analisar filmes em seus mínimos detalhes. Durante a atividade de encerramento ocorrida na quinta pela manhã, a equipe do festival nos surpreendeu com uma convidada para uma conversa relâmpago com duração de uma hora. Era Lupita Nying’o, atriz queniana radicada nos Estados Unidos, vencedora do Oscar e estrela de filmes como “Us” (Jordan Peele) e “12 Anos de Escravidão” (Steve McQueen). A conversa envolveu tópicos que passavam pela sua carreira, o trabalho na atuação, inspirações de vida e sobre sua difícil tarefa como Presidente do Júri da Competição do Festival de Berlim.
Foram dias incríveis em Berlim que certamente guardarei na memória para o resto da vida. Não há nada mais valioso que estar em grupo, alimentando-se de cinema todos os dias e conversando sobre o que se ama e se quer fazer para sempre.
O Brasil este ano está fortemente representando na Berlinale, com dois curtas-metragens, três longas-metragens e mais de dez talentos participando no Berlinale Talents nas áreas de direção, montagem, roteiro, som. Também no ambiente de mercado, diversos profissionais participantes no European Film Market – EFM, grande parte vinculados ao Cinema do Brasil, organização que promove a conexão e internacionalização para empresas brasileiras nos âmbitos de feiras e mercados mais importantes do mundo.
Também um destaque para a série Betinho, que participou com exibição ontem, no 20 de fevereiro, do Berlinale Series Market com sessão do primeiro episódio exclusivamente para agentes de mercado, potenciais compradores internacionais. A série que conta a vida do ativista Herbert de Souza, o Betinho, interpretado pelo ator Julinho Andrade, que também é codiretor com Lipe Binder, é uma produção Globoplay e acaba por trazer a história do Brasil, por algumas décadas através da história pessoal e profissional do protagonista.
Entre os longas, na mostra Encountersfoi recebido com bastante destaque o filme Cidade; Campo, dirigido por Juliana Rojas e produzido por Sara Silveira, importante produtora brasileira responsável pela estreia de vários novos realizadores brasileiros. O filme de ficção, dividido em duas partes, fala sobre migração, identidade e as relações com a natureza a partir de experiências pessoais. É um filme íntimo que marca a estreia de Juliana em direção solo. Em sua primeira parte, o movimento do campo para a cidade, contando a história de uma mulher que perde tudo no trágico desastre de Brumadinho e precisa se refazer na cidade de São Paulo. Na segunda parte, a história de uma mulher que volta a uma fazenda onde seu pai vivia após a morte dele e junto a sua companheira precisa refazer sua vida, fugindo do caos da cidade, mas lidando com sua ancestralidade e a relação potente com o campo.
Também na Encounters teve destaque a exibição do longa Dormir de olhos abertos, da diretora alemã Nele Wohlatz, que foi filmado no Recife e é uma coprodução da Cinemascópio, importante produtora pernambucana levada por Emilie Lesclaux e Kléber Mendonça Filho. A equipe do longa foi majoritariamente brasileira e pernambucana. O longa trata da imigração chinesa no Recife e traz um belo retrato da cidade e sua cultura, desde um ponto de vista estrangeiro.
Por fim, o longa Betânia, dirigido por Marcelo Botta e que teve também uma lotada exibição na mostra Panorama, trazendo às telas belas paisagens do Maranhão e evocando a cultura do boi, costurando retratos de personagens maranhenses e suas histórias de vida conectadas ao território e sua cultura a partir de uma protagonista, Betânia, que precisa deixar sua casa depois da morte de seu marido.
Foto em destaque: Jurados do TEDDY e programadores da Berlinale 2024.
Luís Fernando Moura
Estou na Berlinale em 2024 convidado para participar do júri da 38a edição dos TEDDY Awards, viajando com apoio da Embaixada do Brasil em Berlim/Instituto Guimarães Rosa e apoio complementar do CCBA. Acho sempre importante destacar esses apoios pois eles revelam o papel ativo das instituições de Estado e de intercâmbio cultural na colaboração indireta para a promoção da participação brasileira em plataformas de impacto global, e isso é para mim um dos detalhes mais preciosos na minha vinda ao festival esse ano. Entendo que venho pela via das políticas de cultura e diplomacia, ligadas ao desenvolvimento econômico e simbólico do ponto de vida não de players da indústria, mas do desenvolvimento humano.
Foto: Luís Fernando Moura / divulgação
É nesse lugar que busco construir uma contribuição para o TEDDY, considerado o júri “queer” mais importante globalmente, ou seja, um júri que atua na vinculação entre cinema e temáticas LGBTQIAPN+. É realmente um trabalho de criação ativa de um ponto de vista transcontinental sobre os filmes, leve-se em conta, para ilustrar e mostrar, que é neste ano composto por profissionais de cinema de lugares tão distantes no mapa como Brasil (meu caso), Paquistão, Dinamarca, El Salvador/Chipre e Nova Zelândia/Austrália.
São também profissionais que atuam em distintas áreas: pesquisa, curadoria e programação (como é meu caso), mas também atuação, ativismo e realização. São colegas de júri de trajetórias e origens muito distintas se dedicando afinal a filmes também de muito variadas formas de cinema, já que este é um júri que se debruça sobre uma seleção de filmes transversal a todas as seções da Berlinale: do cinema mais propriamente considerado experimental ao cinema de ficção mais convencional, estamos vendo, lado a lado, filmes que vêm de universos por vezes radicalmente diferentes: geográficos, simbólicos, econômicos, políticos.
A questão que se mantém, dia a dia, é um território em comum que possa dirigir um ponto de vista, no campo da ideia de “queerness”, em tempos de horror do ponto de vista das políticas globais, e de tensões que mostram os limites das instituições como mediadoras da proteção à vida humana ou do freio à limpeza étnica pela ação ocidental mesma, embora muitas vezes o cinema independente busque ocupar esse lugar de expiação, e tantas vezes venha a nos trazer algum conforto que em dias como esses se torna insustentável. Estamos cercados por contradições de todos os níveis, e é necessário enfrentá-las.
Enquanto a Berlinale se construiu como plataforma global para uma discussão política sobre o cinema – feita, claro, aos modos de uma grande indústria radicada na Europa Central, com todas as implicações que daí advêm, e que revelam também sua natureza “local” –, ao TEDDY se reserva um espaço de atuação com marcas da independência que é de sua natureza. Embora seja buscado na indústria e esteja no coração da Berlinale, é também um projeto cujo sentido político (e econômico) foi construído transversalmente, ligado aos movimentos de sexodissidência e dissidência de gênero que emergiram nos centros de Berlim e que se instalaram na engrenagem da Berlinale.
Na noite de sexta (16), o júri foi apresentado numa recepção pública, podendo se introduzir à comunidade por trás da história do próprio TEDDY, a profissionais de cinema e a pessoas em Berlim que vêm atentas, de perto, entender a feição do júri ano a ano. Acredito que tenha sido um primeiro passo para a percepção da pluralidade que se põe no horizonte, dos desafios em comum e de um primeiro movimento de caminhada em direção uns aos outros com as suas diferenças, em meios às suas diferenças e, se pudermos fazer um bom trabalho, também em direção às diferenças e o que elas venham a poder produzir de significativo no âmbito institucional em suas tantas dimensões. Sabemos que em 2024 há muito para se disputar.
O Berlinale Talents chegou na metade e, apesar de estar cansado com o ritmo intenso das atividades, estou muito satisfeito com as experiências que estou trocando por aqui. Além dos talks com diretores, produtores e montadores de cinema, talvez a experiência mais engrandecedora da qual tenho participado seja a do Editors Studio. Nessa atividade, estou com mais 10 editores do mundo inteiro com atividades mediadas por três tutoras, sendo uma delas indicada ao Oscar de montagem. Tem sido a oportunidade perfeita para compartilhar questões sensíveis do trabalho da montagem de um filme e como os colegas pensam a estética e o estilo dos seus trabalhos. Nos últimos dois dias, cada um dos participantes teve a oportunidade de fazer uma apresentação de 10 minutos para os colegas. Temas como marketing, montagem de animação, meios alternativos e pouco convencionais de pensar a edição de um filme e até como evitar o burnout no trabalho foram abordados. Uma excelente oportunidade de entender que as ansiedades e alegrias da profissão não têm fronteiras linguísticas ou físicas.
A Berlinale é historicamente um festival bastante político e os filmes exibidos apresentam, se não posicionamentos diretos, reflexões políticas importantes. Um aspecto bastante destacado nessa edição foi a posição contrária à guerra na Ucrânia. Além de todos os profissionais de produção usarem um bótom com o urso de outro, símbolo maior do Festival e da cidade de Berlim, com as cores amarela azul, houve falas e pronunciamentos em oposição à situação em algumas sessões do Festival.
Entre os dias 16 e 26 de fevereiro, centenas de sessões em cinemas espalhados por toda a cidade e maravilhosamente ocupadas por cidadãos berlinenses, além dos diversos profissionais que lotam a cidade no período do Festival. Ao público alemão, me parece, interessa-lhes fortemente o que outros países, dos mais diversos, estão produzindo no cinema e isso é fascinante.
Muitos dos filmes exibidos, sobretudo nas sessões de Curtas, Fórum e Panorama, trouxeram mulheres diretoras, o que nos destaca uma força de transformação no cenário internacional. Dos filmes brasileiros, metade foram dirigidos ou co-dirigidos por mulheres, destacando Infantaria, curta premiado pela Mostra Generation, dirigido pela alagoana Laís Santos Araújo.
Destaco também, dentro da programação, um ponto de congruência que observei na produção: filmes voltados à construção de protagonistas femininas consistentes e seus conflitos. São histórias diversas mas que refletem sentimentos, angústias, vidas e problemas do universo das mulheres, meninas em suas diversas gerações e identidades em formação. Alguns deles foram o português Cidade Habat, de Susana Nobre, o espanhol Mátria, de Álvaro Gago. O longa português Mal Viver, de João Canijo. Os curtas brasileiros Miçangas e Infantaria.
Ainda nesse universo feminista, destaco, trazendo outros pontos relevantes, os filmes 20.000 espécies de abelhas, espanhol, de Estibaliz Urresola Solaguren, que acabou por garantir a Sofía Otero o prêmio de melhor atriz trazendo uma espécie de coming of age de une menine transgênero no recorte de sua infância. E o filme And me, I’m dancing too, do iraniano Mohammad Valizadegan, que traz uma protagonista com o único desejo de poder dançar em um país onde as mulheres são impedidas de fazê-lo.
Ainda observando filmes como atos políticos posicionados, como o citado curta iraniano, no qual, ao colocar a própria atriz dançando na rua, os realizadores demarcam uma denúncia concreta e bastante arriscada contra seu estado, cito o documentário Llamadas desde Moscú, do cubano Luís Alejandro Yero, que apresenta imigrantes cubanos gays vivendo na Rússia aos primeiros sinais da guerra contra a Ucrânia e a relação opressora do espaço e da falta de identidade que enfrentam por terem saído de Cuba, pelas necessidades de fugir de seu país, em crise.
Por fim, um outro documentário que conecta a força de uma personagem feminina dentro de um contexto passível de questões quanto à figura da mulher como cuidadora, o documentário La memoria eterna, de Maite Alberdi, documentário chileno emocionante que acompanha a importante atriz chilena Paulina Urrutia e seu marido o jornalista Augusto Góngora, a quem ela cuida já idoso e com Alzheimer.
O filme constrói a partir da ausência de memória dele, a própria memória do homem que ele foi, um jornalista que serviu a seu país como comunicador e crítico à ditadura de Pinochet e que escreveu e refletiu sobre memória, conflitos e justiça. Apesar de acompanharmos a memória dele ser construída através dela num ato de completo amor e cuidado, é inegável a força da personagem da vida real que decide cuidar.
Esses são alguns destaques a partir de um pequeno recorte da programação mas que me possibilitaram inferir sobre um certo olhar, um panorama das sessões e seus aspectos.
A Berlinale é um grande festival e espero em breve voltar pra lá!
Exibido no ‘Forum Special’, A Rainha Diaba recebe novos olhares após ser escaneado em 4K.
“Acho que esta é a última festa que faço aqui”, diz Diaba, usando sua coroa e vários colares, com uma sombra verde que realça a tristeza em seu olhar. No entanto, o que ela não imaginava, nem provavelmente o diretor Antonio Carlos da Fontoura, é que 50 anos após seu lançamento, A Rainha Diaba (1973) estaria festejando pelo mundo, com uma nova cópia escaneada e a vitalidade típica de um filme anárquico, cativando público contemporâneo com sua estética kitsch, sua performatividade excessiva, cômica e brilhante, além de seu impressionante banho de sangue digno de uma história cheia de truques e traições.
De dentro de seu quarto, Diaba (Milton Gonçalves) dirige um negócio de tráfico de maconha na periferia do Rio de Janeiro. Sua primeira aparição é regida pelo suspense. Um grupo de homens está esperando para visitá-la até que possam entrar onde a Rainha está. A câmera atravessa o salão da casa de Diaba, onde podemos ver os rostos de todos os seus convidados, mas ainda não podemos vê-la. A expectativa deles é também a dos espectadores. Finalmente, um corpo preto aparece na tela, raspando sua perna com um canivete. É com essa primeira imagem que A Rainha Diaba constrói sua personagem principal, uma mistura entre violência, feminilidade e mistério.
Em A Rainha Diaba, há dois momentos intrigantes de coletividade, que são conduzidos por Milton Gonçalves: o primeiro, quando as ‘discípulas da Diaba’, durante a festa em que ela aparece triste, se colocam ao lado da Rainha para descobrir quem estaria “atrapalhando seu coreto”; Já a segunda é durante a cena de tortura de Isa (Odete Lara), uma personagem que é arrastada por um grupo de pessoas não-binárias e travestis para um salão de beleza e acaba traindo seu amante, Bereco (Stephan Necessian), que está mexendo na maconha da Diaba depois dela ter sido enganada por Robertinho (Edgar Rugel Aranha), um ex-sócio de confiança da Rainha, que quer tomar o lugar da Diaba no tráfico.
O corpo de Milton Gonçalves é uma presença insubmissa e inescapável, que usa a violência para romper os imaginários convencionais de criminalidade associados ao corpo negro. Além disso, a performatividade do corpo da personagem Diaba provoca, ainda, uma quebra na idéia de criminalidade exclusivamente dominada pelos homens. O corpo negro ganha ambivalência em sua dissidência de gênero, seu excesso performativo e a extensão de seu corpo, que se dá através da coletividade que envolve essa figura.
Mesmo que nem sempre seja vista por nós, objetos de cena, roupas e cores brilhantes se espalham pelo filme, fazendo de Diaba uma presença onipresente. O roxo, laranja ou vermelho dos trajes de seus parceiros de crime irradiam tanta vitalidade quanto a energia emanada pela Rainha. Todos os envolvidos nesta história a mencionam, seja por adoração ou com a intenção de ocupar seu lugar no trono. Esta figura onipresente nos convida a senti-la sem necessariamente vê-la.
Entre os dias 16 e 22 de fevereiro, a produtora e roteirista Thaís Vidal, enviada pelo CCBA-Recife à Berlinale, participou do European Film Market (mercado cinematográfico europeu) e entendendo a importância e a necessidade de espaços como esses para impulsionar a indústria de cinema de Pernambuco, ela fez uma lista de dicas para quem tiver interesse em participar do EFM.
Os ambientes de mercado são espaços fundamentais para a internacionalização de projetos e empresas e é fundamental estar preparade para encarar os desafios dos espaços. Acreditando na importância para todes produtores de Pernambuco, aqui vão as dicas:
Primeiro de tudo, o EFM é um ambiente de negócios, onde as pessoas estão focadas em compra e venda, onde há muitas empresas, instituições e pessoas de distintos portes econômicos dentro do setor que estão interessadas em fazer negócios, portanto é preciso entender como se preparar.
Entender quem são os interlocutores, o que queremos vender ou comprar e qual é nosso patamar de execução econômica nos faz entender bem em que espaços queremos nos apresentar e logo poderemos preparar nossa agenda.
Dica principal: pesquisar o catálogo do Mercado, filmes nas sessões da Berlinale e suas produtoras e verificar se há conexões reais com os seus projetos. Depois disso, entre em contato com todas as pessoas e monte sua agenda antes de chegar em Berlim.
Atenção! Isso não significa fechar-se para coisas que podem acontecer no ambiente. O EFM é um espaço muito grande, que reúne centenas de stands de países, produtoras, agentes de vendas e instituições em geral. Então, lá você pode encontrar novas possibilidades, mas é preciso manter o foco inicial a partir de sua pesquisa sobre pessoas com quem você vai se reunir.
Outra coisa importante é: se puder, chegue ao menos um dia antes do início das atividades, para se ambientar, entender os deslocamentos e, se possível, comprar um chip local, isso vai te facilitar nos deslocamentos e no acesso a e-mail e ao whatsapp para possíveis mudanças na agenda com seus interlocutores.
A dica final é: calma! os ambientes de mercado são enormes, mas cada reunião será um “start” e você vai começar relações que podem gerar frutos futuros para os seus projetos. Você pode sair com negócios mais encaminhados, outros completamente abertos, mas a rede de negócios é fundamental e ela vai crescendo a cada participação num ambiente como esse!
A 73ª Berlinale, que acontece na cidade de Berlim entre 16 e 26 de fevereiro de 2023, recebeu bonitos e importantes filmes brasileiros em sua programação. Apesar da grandeza dos filmes e dos esforços de seus e suas realizadoras, realizadores, produtores, equipes e elencos, que vieram participar do festival, a discreta participação de filmes brasileiros reflete os últimos anos de destruição das políticas públicas no país e por conseguinte dos fundos para o cinema, o que desestruturou o mercado ainda mais diante da pandemia.
A Berlinale tem um caráter bastante político e os filmes brasileiros exibidos aqui este ano acabam por refletir posicionamentos e temáticas relevantes para o cenário político nacional, a partir de formatos e perspectivas distintas, com beleza, drama, humor.
Os filmes exibidos:
A Rainha Diaba, dirigido por Antônio Carlos da Fontoura, em 1974, cópia restaurado com apoio do Janela de Cinema, Festival do Recife, teve sua primeira exibição fora do Brasil, e Berlim.
O estranho, longa dirigido por Flora Dias e Juruna Mallon, de São Paulo, em première mundial, traz os temas da ancestralidade, dos territórios.
Infantaria, curta dirigido por Laís, de Maceió, em première mundial, traz a temática da infância, do crescimento de uma menina e a relação com a menstruação, entrelaçada ao tema importantíssimo do aborto.
As Miçangas, dirigido por Emanuel Lavor e Rafaela Camelo, de Brasília, em première mundial, traz também o tema do aborto.
Ainda hoje, terá sessão do filme pernambucano Propriedade, dirigido por Daniel Bandeira.
Estar numa viagem internacional pela primeira vez é um grande desafio. Cheguei na Alemanha no início da semana anterior e sinto que fui me adaptando aos poucos ao clima, à cidade, ao ritmo do festival e ao contato com diversas culturas, pessoas e situações que ainda são tão novas para mim. Ter sido selecionada no Berlinale Talents Press, uma atividade formativa em crítica cinematográfica, pode ser visto como um salto significativo na carreira. Pela primeira estou vivenciando um festival internacional desse porte e também aprendendo novas formas de trabalhar em coletivo e de construir pensamentos sobre assuntos que nem sempre estive em tanto contato, como estou tendo a oportunidade de experienciar agora.
Os encontros do Talent Press acontecem, em sua maioria, entre o HAU2 e HAU3, espaços onde as atividades da Berlinale Talents se concentram. É importante dizer que, antes de chegarmos em Berlim, nós tivemos cerca de três reuniões de preparação e também escrevemos um texto individual, sobre um dos filmes que está na programação do festival deste ano, Seven Winters in Tehran (2023), de Steffi Niederzoll. Nesses últimos dias, além de conhecer e de me aproximar dos meus colegas críticos (Teresa Vieira, Luise Morke, Jerry Chiemeke, Han Tien, Gayle Sequeira, Dora Leu e Amarsanaa Battulga), estive imersa em uma série de conversas com nossos mentores, Leonardo Goi, Pedro Butcher, Dana Linssen, Michelle Carey e Aily Nash) artistas convidados, com os assuntos dos mais diversos. Vou destacar alguns que me chamaram bastante atenção:
a) Introduction, por Leonardo Goi: Nessa atividade, pudemos nos conhecer pessoalmente pela primeira vez e comentamos os textos que foram escritos a partir do filme de Steffi Niederzoll. Foi muito legal perceber a forma de escrita de cada um dos Talents e também receber um feedback inicial de nossos mentores. Fica bem demarcado que tipo de texto crítico o programa procura, uma vez que nós escrevemos sobre o filme da programação para o blog oficial do Talent, ao mesmo tempo que somos estimulados a ter uma liberdade criativa e também trazer nossa personalidade para dentro do texto.
b) Market Studio & Talent Press – Festival and Market Inspiration: A conversa mediada por Kevin Lee foi dedicada a pensarmos nos festivais de cinema durante e após o período da pandemia da Covid-19. Quando estive no Talent Press Rio, no Festival do Rio em 2019, já havia conhecido Kevin Lee: ele nos deu uma palestra sobre vídeo-ensaio. Dessa vez, o interesse pelas mudanças e impactos produzidos pelo período de isolamento social e geográfico, além da expansão festivais de cinema no formato remoto ou híbrido, mobilizou a atividade, e Talents de outras áreas de formação (como direção, edição, design de som) puderam participar e contribuir para o debate de maneira fortuita. Esses espaços de troca também são muito importantes para conhecermos novas pessoas e acredito que esse é um dos pontos mais fortes da Berlinale Talent: incentivar a criação de conexões entre pessoas de várias áreas de conhecimento e de diferentes partes do mundo!
c) Talent Press: Mentor’s Session II: O mentor Pedro Butcher convidou quatro artistas brasileiros(Janaína Wagner, Chica Barbosa, Lui Avalos e Pedro Harres) para conversarmos sobre VR (Realidade Virtual), cinema experimental e crítica de cinema. Esse foi um dos encontros que mais me empolguei, não apenas por estar conversando sobre cinema brasileiro, mas por ter conseguido pensar sobre VR numa perspectiva mais voltada ao circuito cinematográfico, de possíveis formas de experiência coletiva com a VR e os desafios para torná-la mais acessível e democratizar seu acesso. Além disso, a convergência entre esse tipo de trabalho e de cineastas experimentais (como Janaína Wagner e Chica Barbosa) possibilitou que nós conversássemos sobre a própria ideia de cinema, o que cabe (ou extrapola) essa linguagem e como o diálogo com outras expressões artísticas (como as artes visuais e o VR) acabam por tensionar uma ideia “convencional” de cinema.
Ainda faltam algumas atividades para fazermos! Em breve, compartilho mais notícias e impressões.
CCBA marca presença no 73º Festival Internacional de Cinema de Berlim (Berlinale)
Por Marina Mahmood
Hoje inicia a 73º edição de um dos festivais audiovisuais mais importantes do mundo: Entre os dias 16 e 26 de fevereiro, na cidade de Berlim (Alemanha), acontece o Festival Internacional de Cinema de Berlim (Berlinale).
O festival alemão foi criado em 1978 e, desde então, ocorre anualmente no mês de fevereiro trazendo produções audiovisuais de destaque global. Os filmes exibidos durante o evento concorrem a diversos prêmios, como o Urso de Ouro (Goldener Bär) e o Urso de Prata (Silberner Bär).
A novidade este ano é que o CCBA está enviando a produtora de cinema e sua ex-aluna, Thaís Vidal, para representar o centro no festival. Em Dezembro de 2022, durante debate no Kulturforum no CCBA, Thaís levantou a importância de firmar parcerias internacionais para ampliar o mercado artístico local em Recife (PE) e no Brasil, expandindo formas de captação de recursos pela realização de cooperações e coproduções internacionais.
Com a ida à Berlim, a ideia é que Thaís consiga sondar possibilidades de cooperações internacionais no campo audiovisual entre Brasil e Alemanha. A viagem seria um pontapé inicial para abrir canais de comunicação entre os festivais de cinema alemães e a produção cinematográfica recifense, firmando possíveis parcerias, como por exemplo, o intercâmbio de filmes e de realizadores audiovisuais da Alemanha para o Brasil.
Além de Thaís Vidal, o CCBA apoiou a ida de Lorenna Rocha (pesquisadora, crítica cultural e curadora) à Berlinale. Este ano, Lorenna foi selecionada para o Berlinale Talents – programa de desenvolvimento de talentos do Festival Internacional de Cinema de Berlim (https://www.berlinale-talents.de ).
Dentro do programa, a pesquisadora vai participar de uma formação de crítica cinematográfica junto com pessoas de todo o mundo. A ideia da formação é que os participantes desenvolvam a escrita através das aulas e que realizem uma cobertura crítica do festival publicando textos no site: https://www.talentpress.org/
Recentemente, um dos festivais que Lorenna participou enquanto curadora foi o Janela Internacional de Cinema do Recife. Com o apoio oferecido à Lorenna, o CCBA espera contribuir também com a curadoria da programação do Janela Internacional deste ano (2023).
Thaís Vidal (Recife, 1990) é roteirista, produtora e diretora, Mestre em Roteiro audiovisual (2021) pela Escola Internacional de Cinema e Televisão de San Antonio de los Baños, Cuba. Graduada em Jornalismo (2012) pela UFPE e também Mestre em Planejamento Urbano (2017), cursa atualmente Doutorado em Cinema (2020-2024) pela mesma instituição. Em 2014, lançou seu primeiro curta como roteirista e diretora, o documentário Fora da Ordem. Em 2015, fundou a Ponte Produtoras, empresa focada na produção de longas e curtas-metragens de ficção e documentário de jovens realizadoras e realizadores. Produziu filmes exibidos em grandes festivais como Semana da Crítica de Cannes, Locarno Film Festival, La Havana, Festival de Brasília, Festival do Rio, dentre muitos outros, alguns lançados comercialmente. Seu primeiro roteiro de longa, Sensor de Ausência, está em desenvolvimento, na fase de captação de recursos e conta com coprodução da Vitrine Filmes, tendo sido escrito no mestrado em Cuba e assessorado por grandes nomes da EICTV. Thaís faz parte da Rede Paradiso de Talentos. Em 2022, realizou curadoria para o concurso FRAPA de roteiros de longa e colaborou na escrita do roteiro do próximo longa do diretor Marcelo Lordello.
Historiadora (UFPE), pesquisadora, crítica cultural e programadora. Co-fundadora da INDETERMINAÇÕES https://indeterminacoes.com/ – plataforma de crítica e cinema negro brasileiro (PE/MG). Editora-chefe da camarescura – estudos de cinema e audiovisual (PE). Integrou a curadoria da edição especial do Janela Internacional de Cinema do Recife (2022) e das duas últimas edições do FestCurtas BH (2021, 2022). Desde 2019, ministra cursos e oficinas acerca dos cinemas e teatros negros brasileiros e da crítica.
O CCBA – Centro Cultural Brasil – Alemanha é uma instituição cultural no Recife/Brasil, reconhecido e apoiado pelo Governo Alemão, o Instituto Goethe e o Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico – DAAD. Na sua programação cultural o CCBA valoriza o diálogo com a sociedade civil e a cooperação com parceiros locais em projetos que dizem respeito a debates e desafios contemporâneos. Além disso oferecemos cursos de Alemão e Português (para estrangeiros).